Estou deitada no meu quarto,
fazendo hora. Distraio-me com o movimento da tarde pelo recorte de vidro da
minha janela.
Acho que vai haver um encontro de nuvens no céu. Só não sei aonde, porque elas
passam ligeiras e leves em suas vestes ora densas, ora rendadas ─ como damas a
caminho do baile ─, e logo desaparecem para não perder a hora.
E o azul volta a habitar o céu,
límpido e brilhante.
O vento sopra fraquinho e traz para
dentro do meu quarto um cheiro de pastel frito. Que incoerência!
No terreno em que outrora existia uma
casa em ruínas, as andorinhas voavam sobre o telhado esburacado e as verdes
folhas de bananeiras. Agora elas deslocaram o lugar do seu voo e suas rasantes
rápidas dão-se bem defronte à minha janela. Elas perderam o antigo espaço, mas
eu ganhei um assento na primeira fila para ver um show diário de malabarismos
que me traz sensação de liberdade: com suas asinhas esticadas, elas flutuam e
parecem tão felizes!
E a legião de nuvens continua no seu
andar apressado.
Eu ficaria aqui a tarde toda falando
inclusive sobre o voo engraçado de uma mosquinha que insiste em dar voltas e
mais voltas sobre a minha cama.
Mas a hora já passou. Levanto-me
porque tenho que ir à sessão de terapia. Minha vida não é tão desembaraçada de
problemas quanto a das nuvens, das andorinhas ou das moscas.
Chego perto da janela. Umas nuvens
negras estão se aproximando. Se agirem, vão ser as desmancha-prazeres da tarde
gostosa. Olho-as com desagrado e elas me devolvem o olhar com cenho franzido.
Elas também devem ter seus problemas.
Deslizo o vidro sobre os trilhos. Subo no parapeito e alço voo como as
andorinhas...
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